Discurso de Posse Domingos Pascoal de Melo na cadeira 17 da Academia Sergipana de Letras

20 de outubro de 2009, Aracaju/Sergipe

Historicamente, a primeira academia de que se tem notícia é a que foi fundada na Grécia antiga. O herói grego Academus fez construir um ginásio em certo bosque situado nos arredores de Atenas. Nesse Ginásio, tempos depois, Platão fundou uma escola de ensino filosófico. Ali, sob a orientação daquele mestre, muitos alunos, entre eles o grande Aristóteles, praticaram a arte do diálogo, da discussão, da lógica e da dialética como formas de desenvolver o conhecimento de diversos campos do saber como a filosofia, a matemática, a música, a astronomia e a legislação.

Por ser o lugar conhecido como Jardim Academus, a escola de Platão ficou sendo chamada de Academia Platônica. Desde então, os elementos de um grupo que se reúnem para estudos de temas literários, filosóficos e semelhantes, ficaram conhecidos como integrantes de uma academia, ou simplesmente acadêmicos. O modelo acadêmico brasileiro segue o padrão francês. A Académie Française foi fundada pelo Cardeal de Richelieu em 1635, sob o reinado de Luís XIII de França. Aquela Academia, por sua vez, teve como molde a ‘’Accademia del Disegno’’ criada em Florença, em 1562, por Giorgio Vasari.

No Brasil, o Ceará foi o primeiro Estado a criar uma Academia. A Academia Cearense de Letras, fundada no dia 15 de agosto de 1894, três anos, portanto, antes da instalação da Academia Brasileira de Letras, no dia 20 de julho de 1897. A Academia Sergipana de Letras, por sua vez, foi fundada no dia 1º de junho de 1929. Seguindo, ainda os moldes da “Académie Française” permanecem, nos Sodalícios brasileiros, com muita significação, alguns protocolos e ritualísticas que sustentam a tradição, enobrecem as Academias pátrias e, por extensão, todos aqueles a quem a vida premia com a ascensão a uma das cadeiras dessas casas de cultura e de saber.

Cá estou, portanto, senhoras e senhores, atraído pelos eflúvios desta história belíssima das academias e dos que delas fizeram e fazem parte. Atrai-me a Academia por ser guardião e foro da nossa cultura. Seduzem-me, também, os protocolos e as liturgias remanescentes ainda na “Académie Français”, fundada por Richelieu, e transformados em pilares que sustentam a tradição secular. Nessas augustas casas, entre ordenamentos acadêmicos-literários, e literários, capelos, fardões, estolas e rituais, acontecem também as discussões, as investigações, as argumentações e as reflexões das ideias sobre o mundo e o homem, sobre ter e o ser, sobre o sonho e o real. Resgatam-se a memória, a história e a essência na busca dos sentidos registrados de um passado que serve de base para a construção de um futuro. Estou chegando, Senhor Presidente. Sei que sonhei alto, corri atrás deste sonho, Deus foi generoso. Aqui estou. Aqui estou talvez cometendo a maior ousadia da minha vida. Propondo-me a preencher o impreenchível, substituir o insubstituível, ler um mundo diferente e, para mim, quase ininteligível; posto que Cadeira 17 desta Augusta Casa acomodou em seu espaldar, desde 1929, três grandes luminares da expressão literária, humana e cultural de Sergipe.

Tem como patrono o médico, professor catedrático e militar ASCENDINO ÂNGELO DOS REIS. O Professor Ascendino nasceu em 20 de abril de 1852, em Divina Pastora/SE. Filho de João Francisco dos Reis e Dona Rosa Florinda do Amor Divino, colou grau de doutor em medicina pela Faculdade da Bahia em 1874, defendendo a tese “Diagnóstico diferencial das moléstias do coração”. Foi nomeado 2º Tenente do Corpo de Saúde do Exército, em 1875; sendo designado para a guarnição de Sergipe, onde permaneceu por dez anos, até 1885. Depois, ocupou os cargos de lente de inglês e história, no Atheneu Sergipense, diretor do Parthenon Sergipense, professor de história na Escola Normal e médico gratuito no Asilo Nossa Senhora da Pureza. Em 1886 foi transferido para São Paulo, onde se bacharela em Direito pela Faculdade de Direito de São Paulo, em 25 de novembro de 1889. Reformado como Major em 1899, continua como professor por mais oito anos, até 1907. Logo após a fundação da Faculdade de Medicina de São Paulo, em 05 de fevereiro de 1914, é nomeado lente catedrático de Farmacologia e Matéria Médica, onde ficou até 16 de setembro de 1926.

A Cadeira 17 deste Sodalício teve como fundador o eminente juiz, professor, poeta, ficcionista, romancista e contista, MANUEL DOS PASSOS OLIVEIRA TELES: Nasceu o ilustre literato na vizinha e próspera cidade de Nossa Senhora do Socorro, no dia 29 de agosto de 1859. Eram seus pais o sacerdote Antônio Muniz Teles e Dona Maria Luzia de Oliveira Pita. Com 11 anos de idade, mudou-se para Aracaju onde, como aluno, frequentou até 1877 o Atheneu Sergipense. Em 1880, alça voo para o Rio de Janeiro, onde estudou no Seminário e na Escola Politécnica. Porém, a sua estada na Cidade Maravilhosa foi muito curta, pois logo abandona tudo e vai morar no Recife onde cursou Ciências Jurídicas, e bacharelou-se em Direito, no dia 05 de novembro de 1885. Ainda acadêmico de Direito, foi nomeado promotor público, por curtos períodos, para as cidades de Mossoró, no Rio Grande do Norte e Itabaiana, em Sergipe, onde ficou até 1886. Exerceu o cargo de Administrador da Mesa de Rendas Federais de São Cristóvão e professor da disciplina de língua grega, no Atheneu Sergipense, por nomeação ocorrida no dia 04 de julho de 1898. Foi também diretor de Instrução Pública e professor da Escola Normal, no período de 1898 a 1905, exonerado por ter assumido o cargo de Magistrado na cidade de Estância, dali removido em 1906, para a Comarca de Aracaju, onde, nomeado em 1913, Juiz de Direito da 1ª Vara da Capital, nela ficou até a sua aposentação.

Em 1923, foi por Graccho Cardoso, então presidente da província, encarregado de organizar as obras completas de Tobias Barreto, publicando, em 1924, “MISSÃO TOBIÁTICA AO RECIFE”. Foi colaborador de vários jornais, entre eles: “O MICROSCÓPIO” de Recife, 1882; “O ESTADO DE SERGIPE”, 1900 A 1910; “BELO SEXO”, 1882, “O PORVIR”, 1886; “LARANJEIRENSE”, 1887; “GAZETA DE SERGIPE”, 1891 a 1892; “FOLHA DE SERGIPE”, 1894 a 1898; e “A.B.C.” do Rio de Janeiro, 1923. Jackson da Silva Lima, insigne historiador deste Estado, no livro “História da Literatura Sergipana”, assim fala sobre a obra de MANUEL DOS PASSOS OLIVEIRA TELES. “Por volta de 1877, iniciou-se no trato com as musas, adotando os esquemas esclerosados do ultrarromantismo, subjetivista e piegas. Vez por outra, tenta o modelo condoreiro abastardado, então em voga na província. Na década de 90, em trabalho a que deu o nome de Cristofaneida, adere à forma parnasiana do soneto e passa a literatizar os usos e costumes tradicionais, dentro da linha sertanista de Severino Cardoso. Alguns títulos servem para ilustrar essa tendência: As ilhas, A Vingança do Rio e o Vale do Medo – poetização de lendas sergipanas; A doença – quebranto e reza; A Surra do Coqueiro – recurso para haver frutificação; Madrinha de Apresentar – estratagema para livrar alguém dos encantos da Caipora.

No campo da teatrologia, a sua experiência se restringe ao drama em verso – A Conquista de Sergipe, iniciada em 1900 e concluída em 1903, mas que só veio a ser publicada em livro mais de meio século depois, em 1961. Nos cinco atos em que se desenrola a ação épico-dramática, sempre está presente a visão do conquistador e do elemento branco; o índio, praticamente inexiste: é apenas um eco distante, sem a menor importância histórica. Em Contos e Novelas Sergipenses (1911 e 1912), reuniu de próprio punho, todo o seu repertório ficcional, cuja maioria havia sido divulgada em jornais de Aracaju. MANOEL DOS PASSOS DE OLIVEIRA TELES faleceu no dia 15 de maio de 1935.

Senhoras e Senhores acadêmicos, um povo, uma nação só vive porque pensa. A força e a riqueza não bastam para provar que uma nação vive a vida que merece ser glorificada pela História, sem a criação, sem as ideias, sem o pensar. Só o pensamento, a criação, a literatura e as artes dão grandeza aos povos, atraem para eles universal reverência. É o pensamento a maior riqueza de um povo. Por isso, senhoras e senhores, bendita seja esta Academia Sergipana de Letras, porque abrigou e abriga mulheres e homens que guardam em si o pensamento, tesouros de verdades, belezas, ideias e sensibilidades que nos garantem suplementos de existência e suprime o nosso déficit de beleza, nesta busca incessante do melhor, do mais perfeito.

É nesta busca que me encontro no dia-a-dia. E a suprema honra de hoje assomar a esta Casa do Saber, em que pese o assustador desafio de suceder ao eminente e brilhante jornalista, ficcionista, crítico literário e poeta MÁRIO DE ARAÚJO CABRAL, é um momento de profunda reflexão, pois inútil seria, decerto, nestas laudas fragmentais, procurar a suma do alto e livre pensar desse ilustre sergipano, do seu saber tão fundo e tão certo, de sua independência, de sua livre elasticidade de espírito e intensa sinceridade. Nos tempos incertos e amargos de hoje, um sergipano dessa estirpe não pode ficar longe, na mudez de um mármore, no silêncio incômodo do tempo. Temos que revelá-lo à memória de todos como o grande criador de civilização e cultura.

Mário Cabral era o primogênito do ilustrado casal Antônio Cabral e Maria de Araújo Cabral. Os mais novos, pela ordem cronológica: Marco Antônio, Muciano, Mabel, Margarida e Antônio Carlos Filho. Meu antecessor casou com sua primeira namorada, Sylla. Quando se conheceram, ele tinha treze e ela dez anos. Do relacionamento nasceram três filhos: Malba, Selma e Mário Cabral Filho. Fez o curso primário no Colégio Antônio Vieira, em Salvador e o secundário no Atheneu Sergipense, formando-se em Direito em 1937, na Faculdade de Direito da Bahia. Foi promotor público da comarca de Itabaianinha, advogado, procurador e prefeito desta capital, em 1952, além de diretor da revista de Aracaju e do Sergipe Jornal. Em 1955, passou definitivamente a viver em Salvador, onde foi diretor do Teatro Castro Alves, redator-chefe do Diário da Bahia, consultor jurídico e procurador daquele Estado. Foi membro do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, das Associações baiana e brasileira de escritores e do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia. Foi um dos fundadores da Faculdade de Filosofia de Sergipe. No seu memorialismo, Mário Cabral ilustra a galeria do gênero, ao lado de Gilberto Amado, Antônio Carlos Villaça, Ulisses Lins e Augusto Meyer.

Não escreveu Mário Cabral apenas livros de relembranças, mas, sobretudo, de impressões e reflexões. Seu memorialismo encerra um significado que ultrapassa, em poderes de transfiguração do episódico, os limites da vivência real. Ele extrai dos homens, das coisas e dos fatos uma imagem que reúne poesia e realidade. Em “Espelho do Tempo”, no texto intitulado “sobre os meus pais” presta um tributo de amor, saudade e respeito a seus pais, de forma comovente e exemplar: “Meu pai foi o meu amigo de todas as horas, chamava-se Antônio Cabral. Mantinha comigo longas palestras vivas e inteligentes. Trocávamos idéias. Discutíamos temas. Falávamos de assuntos políticos e sociais, como, também, de assuntos literários e artísticos: Charles Chaplin no cinema, Abraão Lincoln na política, Eça de Queirós na literatura, Mozart e Beethoven na música”. “Minha mãe, Maria de Araújo Cabral, passou pela vida sem deixar estória. Órfã de pai e mãe, morava na cidade de Aracaju, em casa alheia. Baiana de nascimento. Um irmão, Fernando, ficara na Cidade do Salvador com um armazém no Largo da Saúde. Outro, Arlindo, fugira de casa e dele jamais se ouviu falar nem se teve notícias. Minha Mãe casou-se aos 15 anos. Sozinha, sem ajuda da família, sem apoio e sem proteção, criou os filhos, educou-os, assistiu-os nas longas vigílias noturnas, quando a febre os rondava, faminta, como se fora a mensageira da morte. Mas nunca fraquejou. Era franzina, esbelta, de um moreno pálido e de longos cabelos negros. Minha mãe era uma mulher bonita...”. Ainda em “Espelho do Tempo”, em “Auto-retrato”, ele estabelece sua dupla cidadania: “Sou filho da Cidade de Aracaju. Meu Pai sergipano. Minha Mãe baiana. Minha esposa, baiana. Meus filhos, sergipanos. Vivi metade de minha vida em Sergipe e metade na Bahia. Tenho tanto amor à velha Bahia como ao pequeno Sergipe. Assim sendo, já não sei distinguir, na minha vida, as suas coordenadas geográficas e sentimentais, isto é, onde para mim começa a Bahia e termina Sergipe ou onde começa Sergipe e termina a Bahia.”

Aracaju, sua casa-berço, mereceu dele as mais calorosas exaltações, tendo, inclusive, dedicado com muito carinho, dois dos seus melhores trabalhos: Roteiro de Aracaju e, “Aracaju bye bye.” Nesses livros ele registrou com tintas muito fortes o seu amor por esta cidade. O presidente desta Academia, Dr. José Anderson Nascimento, no seu livro “PERFIS ACADÊMICOS” que em breve será lançado, assim se manifesta sobre a forma como Mário Cabral fala desta Cidade no Livro “Roteiro de Aracaju:” “...Roteiro de Aracaju é provavelmente a bandeira literária de Mário Cabral. Nessa obra, o cronista apaixonado pela terra onde nasceu, faz um convite ao leitor para compartilhar esse mesmo bemquerer”. O convite tem luz e cor de quadro de Portinari.” E, citando trecho daquela obra: “Mal o sol desponta, toma conta da cidade, de maneira completa e absoluta, como se se tratasse de uma mulher amada. O sol enche de cintilações a copa do coqueiral, desliza sobre a água do rio, joga um manto de luz sobre a onda do mar, envolve num amplexo luminoso as casas e as igrejas, as ruas e as praças, os morros e as praias”. E nas crônicas: “A luz, O céu, O Nome, A fundação, ele traça uma lírica história de Aracaju:” “O céu da minha cidade, querida, é o céu mais lindo do mundo.” “Mário Cabral é o fotógrafo da cidade amada onde nasceu e vai com seus flagrantes compondo uma paisagem inesquecível das praias, das areias, dos morros, da planície, dos rios, das ruas, da vegetação, e enfim, do homem com suas vivências prazerosas, sofridas ou intrigantes”.

“Manuel Quebra Santo” tem uma história interessante. Nasceu no município de Estância, onde se batizou. Chamava-se, na verdade, Francisco de Jesus. Não era um patriota, pois, durante a guerra do Paraguai, fugiu ao recrutamento militar. Casou-se, em São Cristóvão, com Almerinda, natural de Mangue Seco. Era marítimo. E a mulher, não se conformando em esperá-lo, abandona-o. Não se deixou abater por esse golpe. Foi ser pescador e, como ficara sem Almerinda, arranjou, para começo de conversa, uma outra mulher, já sem a formalidade do casamento. Passou a ser partidário da poligamia, vivendo, ao mesmo tempo, com três mulheres. Desse modo, aos setenta anos de idade, na Atalaia Velha, contava com 66 filhos. Eis parte da relação: da ingrata Almerinda 3, de Agripina 1 e de Lindaura 11. Dos outros filhos ele não sabia, ao certo, a procedência. Mas que tinha 66 filhos, lá tinha mesmo, com toda certeza”. Escreveu o cronista sobre os tipos populares: “Cabo Lino”, um engraxate; Zé Cavalo, ex-combatente da Guerra do Paraguai e até o 14 Discurso de Posse de Domingos Pascoal de Melo ainda lembrado, “Tou te Ajeitando”.

Importa enfatizar que o lembrado acadêmico não se esqueceu das “fontes pobres e tristes”, dos transportes elétricos; do cinema; do teatro e do rádio; do velho cabaré Vaticano; dos velórios; do primeiro automóvel de Aracaju, em 1913, um Ford; das revoluções; dos hotéis e restaurantes; dos bairros; dos jornais e das revistas, além de tantos outros aspectos políticoeconômicos da cultura sergipana. Na Poesia de Cabral, a palavra poética e a palavra religiosa se confundem. Nela ele cria, pela imagem, mitos, exorcismos, hinos, ritos. Evoca, nas imagens surreais, o evangelista-poeta do Apocalipse. Ali Mário Cabral exprime uma realidade que nos estarrece. Sobre os poemas que compõem o Juízo Final. Ele diz: “Juízo Final é uma coroa de sonetos. Os versos não apresentam um maior trabalho de arquitetura literária: são versos simples, em busca tão-somente da captação da ideia essencial. O tema é forte, estranho, apocalíptico, em uma sucessão de quadros e de visões por vezes desconexas...”. “...No fundo, encerra um tema de ordem pacifista, sem cuja vitória integral e absoluta o mundo resvalará para o caminho inevitável da autodestruição...”.

São imagens fortes criadas pelo gênio cabralino e também citadas no livro “Perfis Acadêmicos” do Dr. José Anderson Nascimento. Era uma visão sem par dos continentes Pelo abraço dos mares irmanados O bafio sujo dos vulcões ardentes Crestava a messe dos viventes prados E a descrição aterradora prossegue noutro soneto: As árvores, legendárias, Através dos caminhos, Eram monjas rezando com fervor, 15 Discurso de Posse de Domingos Pascoal de Melo Enquanto o tredo espírito das furnas Punha de pé as maldições noturnas Cobrindo o céu de luto e de terror. Sombras passavam, fúnebres, curvadas Rumo à chama letal de luz sulfúrea... Bocas em maldição, alucinadas, Sorviam lama da mais torpe injúria... “Eu vi as negras nuvens açoitadas Cobrindo o céu de luto e de terror. Fácies de abutres, lívidas, pasmadas, À luz vermelha de sanguínea cor.” No conjunto de sua lapidar “COROA DE SONETO”, sofremos o pasmo de uma humanidade que marcha, porém conduzindo o seu próprio féretro. “E vi a humanidade, já perdida, Destruindo, ela própria a própria vida, No instante amargo da explosão final” E como são doces aos ouvidos as aliterações do soneto “Tempestade”... “Paira, presa no ar, procelosa porfia. E lenta e lassa e leve a loura luz solar Se espraia em sensações de essência singular, e é quimera, clarão, cálida cor sombria. Vibra e avulta, violenta, uivando a ventania. Morre o meio marasmo. Imenso emaranhar. Nuvens negras navegam o navio da anarquia, Desgarradas, descendo, em doido desfilar. Tenebroso trovão a terra toda atroa. Rola, ruge, regouga, em hórrido rugido E se vai, já perpassa e lá longe reboa. E a chuva chove enchendo charcos e baixios. E o rumoroso rio em rouquenho arruído Foge em fartos florões de flocos fugidios...”

Reafirmo, senhor presidente, senhoras e senhores acadêmicos, que não sou um homem de letras, mas um amante das letras, da literatura como interpretação mais profunda da alma dos homens, da essência dos fatos e da vida. É através dela que viajamos, sem riscos de tragédias, até o topo do mundo, de onde contemplamos o espetáculo da vida, envolta nas nuvens do mito. Senhores acadêmicos, não me julguem pretensioso por querer adentrar este augusto templo onde se cultua a palavra, pois me postarei genuflexo, e farei de minha permanência aqui uma profissão de fé neste instrumento de poder supremo, com que Cristo ressuscitou Lázaro, com que Hitler eletrizou a Alemanha, na fúria enlouquecida do seu delírio; com que Mahatma Gandhi libertou uma nação sem disparar um único tiro; com que Antônio Conselheiro resistiu em Canudos à prepotência republicana.

Desejo, pois, que o meu aprendizado aqui me possibilite cultivar a palavra em todas as dimensões e em todas as suas funções: - Na sua função LÚDICO-POÉTICA, para criar coisas novas e desnecessárias, num ato gratuito gerador de alegria. - Na sua função EMOTIVA, para manifestar sentimentos, delinear metas, desenhar projetos, esquadrinhar desejos e definir sensibilidades. - Na sua função APELATIVO-PROGRAMÁTICA, para marcar os meus compromissos políticos e sociais e mensurar minha caminhada na participação e comunhão com meu povo. - Na sua função COMUNICATIVO-HUMANIZADORA, para que, como um pássaro que emigra de minha voz, possa anunciar a verdade do que sou e do que pretendo ser. Senhoras e Senhores, ao entrar nesta casa, não pensem que entro só; entram comigo lembranças e pessoas que me fazem para sempre devedor por me abrigarem no seu território de afeto e de amor: meus companheiros do Movimento de Apoio Cultural Antonio Garcia Filho, meus companheiros de Trabalho, do Tribunal Regional do Trabalho, meus queridos amigos advogados, meus pares do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB, secção Sergipe, meus conterrâneos da CACESE, meus irmãos da Infonet, da Revista Perfil e da Info Grafics.

Agradeço a Deus, a quem sempre recorri nos momentos de angústias e dúvidas, por permitir a este seu ingênuo servo este momento de tanta glória. Grato aos meus pais, na pessoa de minha querida mãe, aqui presente, representando tudo o que fui e o que sou, dona Lídia Ximenes Melo. A ela agradeço por ter sido a minha maior e melhor professora nas lições da vida, do amor e do respeito; a meu querido pai, Sebastião Ximenes Melo, em memória, por tudo; mormente por me ter ensinado a verdadeira ética: a ética socrática. Ensinou-me, sem sequer ter escutado falar de Sócrates. Mas, por intuição, imprimiu em mim o respeito à regra, à lei, ao outro e a Deus: qualidade que procuro portar por onde quer que eu vá, só me arrependendo quando a esqueço ou a negligencio. Agradeço a Ana Maria, irmã querida, que aqui representa todos os outros irmãos que por motivos outros não puderam comparecer a esta solenidade de tanta significação para mim e para a minha família. Agradeço a um anjo que existe na minha vida a minha querida e muitíssima amada esposa Maria das Graças Monteiro Melo. Meu porto seguro de amor e de afeto. A minha filha querida, Ana Rita, por todas as lições que me ensinou na árdua função de ser pai.

Meus nobres acadêmicos, chego à ilustre companhia dos senhores, com a certeza de que a vida foi generosa para comigo, deu-me mais do que lhe pedi e mereci. Pobre de bens materiais, trago no meu surrão de sertanejo bens incontáveis de outra ordem: esposa e filha que são a alegria diária e o incentivo maior do meu trabalho; amigos perfeitos na amizade; muitas mãos estendidas e corações fraternais. E se houvesse merecido, poderia ter trazido mais bagagem, para compatibilizar-me com a riqueza de talentos que encontro nesta casa. Agradeço-lhes a gentil acolhida. E tenho consciência de que a vida aqui me põe diante de um novo caminho, largo e luminoso, mas que também se faz áspero e duro pelos compromissos e responsabilidades. Por isso peço a bênção de Deus e de todos, para que não me falte nunca o ânimo de caminhar. Obrigado!










Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Academia Sergipana de Letras e Academia Sergipana de Medicina

ACADEMIAS LITERARIAS: AS FACES DO INTERCÂMBIO CULTURAL